Carnaval de rua do Rio reage contra privatização da folia

 em artes

Blocos cariocas publicam carta aberta em que criticam monopólio e falta de regras

Na quinta-feira que precede o Carnaval (8), 442 blocos e nove associações carnavalescas publicaram corajosa carta aberta em que denunciam “poder paralelo” na atual promoção dos cortejos. A alegação é de que o modelo utilizado pelo prefeito Eduardo Paes vai “estrangular o carnaval de rua”.

O documento avança contra o chamado caderno de encargos, cujo modelo foi criado em 2010 para atender às necessidades de infraestrutura da cidade. O texto cita que “há muito os blocos cariocas têm sido desrespeitados e oprimidos” pela atuação da prefeitura.

Os blocos e associações ressaltam que no modelo de gestão atual, as ruas são “vendidas” pela empresa vencedora da licitação, a fabricante de bebidas AmBev, que se torna “detentora” de “todas as verbas e de todas as contrapartidas”. No entanto, os valores não são repassados aos blocos e ainda restringe à marca vencedora no caderno de encargos um patrocínio direto às agremiações.

O texto defende a regulamentação e o combate ao “monopólio e a ação predatória de uma empresa que age como se fosse a lei”. Há, ainda, o alerta para a fuga dos patrocinadores para outras cidades e em outras direções. 

Confira o documento completo:

CARTA ABERTA DO CARNAVAL DE RUA CARIOCA

O poder paralelo do Caderno de Encargos vai estrangular o carnaval de rua do Rio

Alguma coisa está muito fora da ordem no Carnaval de rua do Rio de Janeiro. Não bastasse toda burocracia que a cada ano aumenta inviabilizando blocos de completarem suas inscrições, cresce cada vez mais e de forma silenciosa um poder paralelo, que impacta especialmente a viabilidade financeira dos blocos cariocas: o atual modelo do caderno de encargos.

Há muito os blocos cariocas têm sido desrespeitados e oprimidos por este antigo modelo criado em 2010, com o objetivo de atender as necessidades de infraestrutura da cidade para um carnaval em crescimento. No entanto, ele tem sido questionado publicamente pelos blocos e associações carnavalescas, sem nenhuma mudança favorável até agora.

O fato é que ele se tornou absurdamente injusto e desequilibrado, com enormes distorções. Inclusive, evidencia-se que a empresa ganhadora passou a exercer “papel legal” – o que caberia à Prefeitura, se fosse o caso – denunciando e induzindo a multas as empresas que decidem apoiar os blocos sem estarem no chamado patrocínio oficial.

É público e notório que o carnaval movimenta 4,5 bilhões de reais na economia carioca. Também é evidente que a maior parte deste valor vem dos sete milhões de foliões, e é inquestionável a participação do carnaval dos blocos na composição deste bolo. No entanto, diferente de outras capitais que promovem linhas de fomento ao carnaval de rua, o município do Rio de Janeiro, além de fechar o cerco das verbas de patrocínio, também não direciona nenhum edital específico para os blocos.

Sobre o modelo de gestão e o contexto atual, o fato é que as ruas do Rio de Janeiro são “vendidas”, via caderno de encargos, pela empresa vencedora da licitação e que se torna “detentora” de todas as verbas e de todas as contrapartidas. Nesse modelo, a título de prover a infraestrutura, os mais altos patrocínios são direcionados a ela.

Mas o que mais chama a atenção, no entanto, é que nada dos valores movimentados e captados é repassado aos verdadeiros atores da festa. Pior, estes ainda lidam com a proibição que é ditada pela empresa vencedora ao mercado.

Assim, a marca que não está com a empresa vencedora no caderno de encargos não pode escolher patrocinar diretamente somente os blocos. A alegação é que, para estar no carnaval de rua, tem antes e acima de tudo que estar com a prefeitura. Resultado: as verbas – que segundo a maioria das patrocinadoras não alcança os dois lados – ficam apenas na conta da infraestrutura. Mas então quem paga o fazer artístico, que é o grande motivo da festa? Por enquanto, apenas a tradicional cervejaria tem se mantido nos dois lados, mesmo assim sem conseguir alcançar a todos.

Fato recente que despertou ainda mais o desagrado de todos com o caderno de encargos e com o modus operandi desse ecossistema foi a mudança de lado da marca Ifood. A empresa em 2023 patrocinou vários blocos cariocas diretamente, e que em 2024 migrou para o patrocínio da produtora oficial, deixando os blocos a ver navios. O pior é que foi vendida uma falsa idéia para a marca de que poderia fazer o que quisesse nos blocos. Não pode! Comprar o patrocínio oficial não é comprar o direito aos blocos, que fique claro!!! São propriedades distintas. Não há conexão de uma marca com o carnaval estando em meio a multidão sem presença nos blocos e suas redes sociais, camisas e trios elétricos.

A criatividade coletiva, o fazer artístico, não pode ser atrelado ao patrocínio oficial que claramente, pela composição do caderno de encargos só prevê gastos com banheiros químicos, grades, ambulâncias e publicidade. E aí fica a pergunta: se as marcas não querem mais patrocinar os blocos, se todo o dinheiro do patrocínio corre para uma mesma direção, quem pagará a conta dos músicos, trios elétricos, aderecistas, figurinistas e outros tantos profissionais da cadeia criativa do carnaval?

O que queremos?

Sem uma regulamentação clara no âmbito municipal, não há como estabelecer as regras do jogo e as competências de cada parte. Não há como acabar com o monopólio e a ação predatória de uma empresa que age como se fosse a lei. Não há como mudar a percepção do mercado e trazer uma situação mais confortável para o lado de quem de fato faz a festa.

Como em outras importantes cidades de carnaval, é urgente um caderno de regras do que pode e do que não pode, de parte a parte, sem os excessos que pesam sobre os blocos. Esse caderno precisa, acima de tudo, ser construído a muitas mãos. Uma cartilha com permissão clara para a distribuição de brindes, para a presença de marcas nos trios e nos materiais dos blocos entre outras ações, para que as patrocinadoras possam escolher de que lado querem estar.

Do jeito que está, é certa a fuga dos patrocinadores para outras cidades e em outras direções. Se não mudarmos imediatamente esse modelo, o carnaval de rua vai morrer na cidade que o criou. Esses que o usam unicamente para seus interesses comerciais serão responsáveis pelo fim dos blocos no Rio. Vão acabar com a nossa mais democrática manifestação popular, sufocando-a pela falta de financiamento. Alguns dos blocos já ficaram pelo caminho. Que seja o fim desse absurdo.

442
A Rocha da Gávea
Agytoê
Agytoê
Aí Sim
Alegria da República
Balanço do Jamelão
Balanço do Pinto
Banda Afonso Pena
Banda da Amizade
Banda da Conceição
Banda da Inválidos
Banda da Seans Pena
Banda das Quengas
Banda do Jiló
Banda dos Amigos
Bangalafumenga
Baque Rebate das Montanhas
Barbas
Batuque das Meninas
Batuquebato
Beco do Rato
Blocão do Totó
Bloco 7 de Paus
Bloco AREIA
Bloco BATUKE DE BATOM
Bloco Brasil
Bloco carnarvalesco Unidos da Ribeira
Bloco carnavalesco 20 de Ouro do Mestre Odilon
Bloco carnavalesco Cabrito Mamador
Bloco carnavalesco Quem Vai Vai Quem Não Vai Não Cagueta
Bloco carnavalesco Vermelho e Branco da Z-10
Bloco Come e Dorme
Bloco da Tartaruga
Bloco das Divas
Bloco Nada Deve Parecer Impossivel de Mudar
Bloco do Sargento Pimenta
Bloco do Serragen’s; Bloco Toma Uma; Bloco da Colônia Bloco do Camelo
Bloco Ilha Encosta
Blok’nRoll
BloQueen
Buda da Barra
Butano na Bureta
Caramuela
Carmelitas
Carnaeco
Céu na Terra
Chora 10
Cidade Nova
Concentra Mas Não Sai
Coração das Meninas
Cordão da Bola Preta
Das Madames
Dez e Music
Dinossauros Nacionais
Divinas Tretas
Do Rock
Do Saara
Dus Impussivi
É Pequeno Mas Não Amolece
Eles que Digam
Empolga à 9
Escorrega Mas não Cai
Estrategia
Eu Amo a Lapa
Eu Amo Cerveja
Eu choro Curto mas Rio Comprido
Exagerado
Fanfarra Festiva Tricolor
Faroeste Cabloco
Fervo
Fiquei Firme
Flor de Lis
Fogo & Paixão
Foliões da Prainha
Gambás
Gigantes da Lira
Imprensa Que Eu Gamo
Independente do Morro do Pinto
LambaBloco
Laranjada
Leão da Pedra
Liga Portuária Encontro de Blocos
Me Enterra na Quarta
Meu Bem, Volto Já
Mini Bloco
Monobloco
Morena do Dom
MP8
Multibloco
Nem Muda Nem Sai de Cima
NossoBloco Oficial
Ocupa Carnaval
Olha Pá Mim
Olho do Furacão
Orquestra Voadora
Perereca do Grajaú
Pifania da Mata
Pinto Sarado
Piranhas da Senador Nabuco
Piranhas do BDS
Planta na Mente
Que Bloco é Esse?!
Que Merda É Essa
Que pena amor
Quizomba
Radiologia
Rebarbas
Rego Barros
Regos Barros
República Suburbana
Rio Maracatu
Seu Kuka é Eu
Simpatia É Quase Amor
Só cachaça
Sou da Gema
Superbacana
Suvaco do Cristo
Tá Pirando, tá Pirado, Pirou
Terreirada
Toca Raul!
Turbilhão Carioca
Último Gole
Urubu Malandro
Urubuzada
Uruguaiana
Vagalume, o Verde
Vai Tomar no Grajaú
Vamo ET
Virtual
Ligas e Associações
Amigos do Zé Pereira
Carnafolia
Coreto
Liga do Centro
Sambare
Sebastiana
União dos blocos da Ilha do Governador
Blocos e bandas da Zona Portuária
Foto em destaque: Bloco Fogo e Paixão | Fernando Maia/Riotur

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