‘AmarElo – É Tudo Pra Ontem’: Emicida dá aula e reivindica protagonismo negro na história brasileira
Documentário lançado na Netflix deve ser apresentado em todas as escolas do país como uma aula de história, a mesma apagada pela versão oficial
O documentário ‘AmarElo – É Tudo Pra Ontem’, que traz bastidores do show do álbum ‘AmarElo’, de Emicida, era ansiosamente esperado pelos seus fãs. A espera valeu a pena. O disco, que virou experimento social e se destrinchou em vários projetos, fecha mais um ciclo com a produção arrebatadora junto à Netflix, que deve ser apresentada nas escolas de todo o país.
A construção da narrativa idealizada pelo brilhante Emicida e roterizada por Toni C faz com que a produção, dirigida por Fred Ouro Preto, não seja um simples registro de um show com uma história por trás. Cada linha contada pelo rapper é regada de música e história que faz arrepiar do início ao fim.
O ditado Iorubá citado no início do documentário revela o que está por vir e o que se pretende (re)construir: “Exu matou um pássaro ontem com uma pedra que só jogou hoje”. Emicida, homem negro bem-sucedido e com voz potente através do rap, e que hoje emprega centenas de irmãos, começou sua luta lá atrás, através dos seus ancestrais.
É essa história que é contada em ‘AmarElo – É Tudo Pra Ontem’, a mesma que é negada através do conto oficial dos livros didáticos. Emicida dá voz a negros que foram essenciais para que hoje ele esteja de pé, forte e mantendo a luta viva através de sua arte.
“Vencer é muito mais que ter dinheiro. Esses jovens querem mais que ser famosos, querem reescrever a história desse país. Eu sou um desses jovens”, se apresenta Emicida, ao falar de grandes nomes da música (todos negros). Em seguida é mostrado os bastidores do show no Theatro Municipal de São Paulo, construído por negros que tiveram retirado o direito de estar naquele espaço. E no dia 27 de novembro de 2019, aquilo “era tudo deles”.
É no palco do Municipal de SP que se desenrola a “aula de história” de Emicida. Foi nas escadas de lá que o Movimento Negro Unificado (MNU) surgiu, em protesto contra o racismo e a violência contra a população negra em plena Ditadura Militar. E alguns ativistas que participaram do ato agora estão dentro do teatro, juntos com outros negros que nunca tinham pisado no espaço, assistindo Emicida. E esse é só alguns dos exemplos mostrados de como o local está vinculado ao negro e sua história. E só mais dos momentos que emocionam o espectador.
Emicida é didático, o que é necessário ao revelar histórias de líderes, músicos, personalidades e ativistas negros importantes para a história do Brasil, de Luiz Gama,passando por Lélia Gonzalez, até Marielle Franco. O rapper mostra que eles sempre estiveram ali, nos acontecimentos mais importantes do país, mas que foram apagados da narrativa branca. Mesmo sendo personagens importantes para a criação da cultura do país.
A linha do tempo é dividida com os bastidores e apresentações do show, mostrando que tudo está ligado e reforçando a grandiosidade do álbum ‘Amarelo’. O disco tem amor, religiosidade, amizade, sonhos, rotina, paternidade, gritos por justiça, reparação histórica e a mensagem de que a luta não acabou.
Com o documentário, produzido por seu irmão Evandro Fióti e a empresa de ambos, a Laboratório Fantasma, Emicida reforça sua genialidade e faz, de fato, história. Num país que nega o racismo, é urgente assistir ‘AmarElo’. E esse documento dentro de uma gigante do streaming mundial faz ele ser potencializado, faz reverberar. Que assim seja, porque, como diz Emicida, “é tudo pra ontem!”.
Avaliação: Excelente