‘Faz de Conta que NY é uma Cidade’ explora paixões de Fran Lebowitz e Scorsese
Ensaísta e diretor versam sobre o amor pela metrópole em minissérie
Quem é Fran Lebowitz? Até perceber seu nome ligado a Martin Scorsese, confesso que desconhecia o trabalho da ensaísta antes da minissérie Faz de Conta que NY é uma Cidade (Pretend It’s a City, no original), uma pérola lançada pela Netflix no começo deste ano. Em sete capítulos que abordam temáticas diversas, Fran e o diretor, que também comanda o programa, versam sobre seu amor por Nova York, talvez a metrópole mais conhecida do planeta, e seus problemas passados e atuais, além de sua constante transformação.
O destaque, claro, é Fran Lebowitz. Com um humor afiado, ácido e um tempo perfeito para a comédia, ela não economiza frases demolidoras sobre o que é, afinal, viver em uma grande cidade. Sentados em uma mesa de um clube, em uma entrevista em auditório ou andando pela biblioteca de NY, a dupla faz novas reflexões sobre um espectro tão amplo quanto diversificado: esportes, tecnologia, o que “esperar” da nova geração, envelhecimento e relações pessoais que perpassam uma amizade de décadas. Ambos também colaboraram no documentário Public Speaking, há 10 anos, mas a proposta aqui é outra.
Faz de Conta que NY é uma Cidade, busca investigar o porquê das opiniões (e irritações) e os argumentos firmes de Fran Lebowitz e há muitas gemas para apreciar em cerca de 30 minutos por episódio. Scorsese mistura tais conversas com perguntas e respostas do público, entrevistas anteriores de Lebowitz com gente como David Letterman e cenas da humorista simplesmente caminhando na rua. A minissérie também aborda o início da carreira de Fran, que começou exercendo seu ofício escrevendo artigos para a Interview Magazine, incluindo uma crítica do segundo filme de Scorsese, Sexy e Marginal. Como não poderia deixar de ser, os momentos em que os dois contam passagens em comum estão entre os melhores da leva.
As observações incisivas da ensaístas, por vezes ranzinzas, oferecem momentos de risada garantida. A “discussão” com o grande Spike Lee sobre a importância dos esportes, como quando Fran Lebowitz conta que assistiu uma luta de Muhammad Ali “apenas para ver as roupas”, é diversão garantida. O tópico sobre libertação sexual encontra sua versão definitiva em uma frase da humorista: “Nada é melhor para uma cidade do que uma densa população de homossexuais furiosos”. As pensatas mostram uma perspectiva muito interessante sobre maneiras de enxergar a vida e o diretor magistralmente coloca tudo em movimento com precisão cirúrgica e poética, especialmente quando as cenas exibem perguntas aparentemente comuns, que Lebowitz responde mostrando graça e sensatez enquanto anda sobre uma grande maquete da cidade.
O título, que vem de um comentário de Fran sobre como os habitantes de NY se comportam nas ruas quando estão ligadas em seus celulares e não no mundo ao redor, é parte dessa perspectiva que funciona quando a dupla está dentro e fora de cena. Scorsese costuma colocar a câmera logo acima do ombro, para que possamos imaginar a experiência de uma noite fora com sua amiga. Faz de Conta que NY é uma Cidade não quer mudar nossas opiniões, mas funciona perfeitamente bem como uma velha e boa conversa onde todo mundo ganha.
Avaliação: Muito bom