Os melhores discos internacionais de 2020
Confira nossa lista dos melhores do ano
Como escrevemos na nossa lista dos discos nacionais deste ano, a pandemia da covid-19 atingiu artistas em todos os segmentos, e também fora do Brasil. Felizmente, também há boas músicas sendo feitas em todos os cantos do planeta, que se estendem além do inglês.
Escolhemos, sem ordem de preferência, os dez melhores discos internacionais de 2020. Ouça alto:
Backxwash – God Has Nothing To Do With This, Leave Him Out It
Se você não conhece essa artista, cuja performance é um elemento vital de sua arte, procure em seus canais. Backswash vem seguindo neste God Has Nothing To Do With This, Leave Him Out It temas já explorados anteriormente, como a ligação entre fé, religiosidade e sua sexualidade. Com samplers inspirados no rock (e no metal), ela constrói, com suas próprias palavras, uma “versão de perdão e coisas que eu preciso enfrentar para chegar à minha versão disso”. Pode ser uma escuta desafiadora, mas altamente recompensadora.
Dua Lipa – Future Nostalgia
A celebrada cantora mergulha de vez na disco music com Future Nostalgia, um combo de influências que fizeram sua cabeça durante a infância. Dua Lipa se juntou a diversos produtores, que ajudaram a moldar o clima do álbum e o fazem transcorrer sem atropelos. A inglesa brilha em canções como Physical e Hallucinate, além da estourada Don’t Start Now, um possível hino pré-covid. A constatação é que a artista parece apenas ter arranhado uma (pequena) superfície ao mostrar parte de suas credenciais nessa possível nova e acertada fase.
Fiona Apple – Fetch the Bolt Cutters
Não importa se Fiona Apple demora muito tempo para lançar um novo disco, ele será sempre obrigatório. Exagero? Ouça Fetch the Bolt Cutters, uma coleção de faixas calcadas em percussão, que a compositora classificou como “orquestras percussivas” e constate. A crueza de algumas músicas, gravadas na própria sala de Fiona, se entrelaçam às excelentes letras, que retratam relações complicadas com homens, outras mulheres e experiências pessoais como bullying e assédio sexual. FtBC soa libertador e conciso, forte e inspirador, e certamente um marco para a artista.
Freddie Gibbs e The Alchemist – Alfredo
Há algum tempo o rapper Freddie Gibbs esmerilha um ótimo álbum atrás do outro. Alfredo, em parceria com o produtor The Alchemist, parece condensar o seu melhor. Freddie, conhecido por rimar basicamente sobre qualquer coisa, está em seu melhor junto ao beatmaker. São temas e batidas fluidas e igualmente densas, ancoradas por versos afiadíssimos. O universo do disco, familiar aos temas do artista, retrata com crueza e sem qualquer glamour a vida de crimes descritas com precisão cinemática por Gibbs, como em Frank Lucas e Scottie Beam.
Idles – Ultra Mono
Já falamos aqui do novo lançamento da banda de pós-punk mais criativa da atualidade. Ultra Mono, com as canções mais agressivas do Idles, é um senhor testamento do grupo sobre aceitação. A mira de Joe Talbot e seus companheiros é mais certeira do que nunca, cruzando ataques a políticas neoliberais, racismo, estupro e também a seus odiadores com uma potência sônica que perpassa influências de Kanye West a The Fall. O cruzamento entre humor (a sagaz Model Village, a óbvia Anxiety) e urgência (War, Grounds) segue dando frutos.
Jessie Ware – What’s Your Pleasure?
Entre os que mais gostamos esse ano, What’s Your Pleasure? é o mais coeso desta lista. Jessie Ware, com outros três álbuns na bagagem, despeja confiança e suingue em um conjunto de faixas que pede a repetição. As influências vão de Diana Ross (principalmente nos maneirismos vocais, como os sussurros em Spotlight, que abre o disco e na faixa-título) até a psicodelia, como na tecladeira soturna deIn Your Eyes. “Ontem à noite nós dançamos/E pensei que você estava salvando minha vida”, diz ela em Mirage (Don’t Stop). Jessie só quer se divertir e nos leva com ela.
Les Amazones d’Afrique – Amazones Power
Este supergrupo do Mali formado em 2015 por gente do quilate de Mariam Doumbia (da dupla Amadou & Mariam), Mamani Keita e Angélique Kidjo, gravou Amazones Power entre 2018 e 2019, mas a obra segue muito atual. Misturando diversas linguagens africanas e o inglês e o francês, as Les Amazones d’Afrique repassam mensagens feministas urgentes e lutam por igualdade de gênero, retrato de um continente devastado por guerras que faz muitas mulheres vítimas. Entre o desert blues, o funk griot e o pop e rock, esta é uma obra que requer escuta. E atenção.
Natalia Lafourcade – Un Canto Por Mexico vol.1
Ganhadora do álbum do ano no Grammy Latino, Natalia Lafourcade vem cantando as tradições do México há algum tempo. Em Un Canto por Mexico Vol 1 (este que vos escreve já está feliz por um possível volume 2), Natalia repete a dose alternando entre o clima romântico e também festeiro que permeia as canções. Para quem é familiarizado com a música da mexicana, a grande orquestra de mariachis segue presente, com coros dirigidos pelo grande Nando Hernandez. As participações especiais (Jorge Drexler, Emmanuel Del Real) só agigantam o trabalho.
Run the Jewels – RTJ4
O Run the Jewels, da dupla Killer Mike e El-P segue urgente em um ano de protestos e consolidação do movimento Black Lives Matter em solo americano. Facilmente o melhor trabalho dos dois (e olha que RTJ2 é um páreo duro), RTJ4 tem foco cirúrgico. Policiais racistas e violentos, a narrativa opaca da mídia corporativa, a opressão do sistema capitalista e outros alvos, com batidas que parecem ter sido feitas para caber no ritmo inquietante e pesado de ambos. São hinos contra a intolerância, contra para onde a humanidade está caindo. É documento histórico.
Saul – Untitled (Rise)
Pouco se sabe sobre o coletivo Saul e as especulações só aumentam lá fora. Mais cedo este ano, o grupo também lançou Untitled (Black Is), discaço que parece uma prévia para Untitled (Rise). Aqui é possível perceber algo especial logo nos primeiros minutos. A mistura de canções de protesto com pista de dança já levou há mais mal exemplos que bons, mas aqui o contrário é flagrante. Enquanto expões mensagens diretas e fortíssimas para quem precisa ouví-las, a sociedade branca dominante e preconceituosa, conseguem alegrar da mesma maneira. Genial.