Português, Hélio Morais lança disco recheado de brasileiros

 em música

‘Pisaduras’ tem coprodução de Benke Ferraz, da banda Boogarins

Cantor, compositor, produtor musical e multi-instrumentista, o português Hélio Morais acaba de lançar ‘Pisaduras’, seu segundo álbum solo. Passando pelo indie pop e folk, o novo trabalho é coproduzido por Benke Ferraz (Boogarins), com participações dos brasileiros Kastrup, Toca Ogan (Nação Zumbi), LUMANZIN (também da 131), ÁIYÉ, LARIE (anteriormente conhecide como Labaq) e Djalma Rodrigues.

Os lusitanos Cássio Sales, Rui Carvalho, Miguel Ferrador, Rita Onofre e Edgar Valente também marcam presença em algumas das oito faixas, nas quais o músico revive e faz as pazes com seu passado.

Capa de ‘Pisaduras’, lançado na sexta-feira (23)

Morais é cofundador de duas importantes bandas de indie rock de Portugal, Linda Martini e PAUS. Em 2019, veio ao Brasil se apresentar com PAUS, gravaram um EP na extinta RedBull Station, além de se apresentarem nos festivais Bananada e na SIM São Paulo. Em 2021, sob o codinome de MURAIS, lançou seu primeiro álbum solo, MURAIS, também com produção de Benke Ferraz e participação de Giovani Cidreira.

“A minha relação afetiva com o Brasil começou em 2015. Fui de férias, voltei assoberbado, a sentir-me pequenino. Mas a sentir-me pequenino por me ver colocado perante tanta coisa por aprender, questionar e acolher. Política, social e musicalmente. E a cada vez que volto ao Brasil, a vontade de permanecer aumenta”, conta Hélio.


FAIXA A FAIXA POR HÉLIO MORAIS

  1. Nem Lua, Nem Marés (feat. Kastrup e Benke Ferraz)

Hélio Morais (voz, guitarra clássica, sintetizador e percussão), Benke Ferraz (sintetizadores, samples e guitarras), Guilherme Kastrup (percussão e samples), Rita Onofre (coros) e Edgar Valente (coros)

Essa música fala sobre a tomada de consciência de que sou confrontado com algo muito maior que eu e de difícil compreensão e acolhimento. Fala sobre esse sentimento de tristeza profunda e impotência, perante tal situação.

  1. Pra Que Chegue Ao Fim (feat. Benke Ferraz)

Hélio Morais (voz, guitarra clássica, sintetizador e percussão), Benke Ferraz (sintetizadores, samples e guitarra) e Cláudia Guerreiro (violoncelo)

Essa música fala sobre as memórias que tenho, de criança, da casa de meus pais. Discutiam muito, gritavam muito. Não era um lugar seguro. A música meio que narra a memória de uma cena de violência que recordo, para tristeza minha.

  1. Voltas e Voltas e Voltas (feat. Kastrup e Benke Ferraz)

Hélio Morais (voz), Benke Ferraz (samples), Guilherme Kastrup (percussão e berimbau), Larie (guitarra clássica) e Rita Onofre (coros)

Aqui eu canto como se fosse a minha mãe, porque também eu passei pelas mesmas violências. Fala sobre uma tentativa de escapar de um lugar onde ninguém deveria ter estado. Mas essa tentativa acaba por resultar numa volta porque, uma vez longe desse lugar, não há o reconhecimento de um porto seguro, só solidão e medo. Então acaba voltando ao mesmo lugar.

  1. Olhos Salgados (feat. Benke Ferraz e ÁIYÉ)

Hélio Morais (voz, guitarra clássica e sintetizadores), Benke Ferraz (sintetizadores, samples e guitarras) e Larissa Conforto (percussão, samples e coros)

A primeira música que escrevi para o disco. Canto como se fosse a minha mãe, conseguindo, finalmente, fugir daquela situação de violência, mas com muita culpa por sentir que me abandonou. Fiz a música pra explicar pra ela que está tudo bem, que entendo o porquê e que não teria outro jeito de se salvar.

  1. Sonhei Coisa Proibida (feat. Toca Ogan, Lumanzin e Benke Ferraz)

Hélio Morais (voz, piano, sintetizadores e percussão), Benke Ferraz (sintetizadores, samples e guitarras), Toca Ogan (percussão), Lumanzin (coros), Djalma Rodrigues (guitarra), Rui Carvalho (guitarra clássica) e Miguel Ferrador (sintetizador)

Até aos meus primeiros anos enquanto adulto, pensei muitas vezes “seria tão mais fácil meu pai desaparecer”. A violência era muita, o medo constante, então fantasiei muitas vezes com um lugar onde isso não existisse. E isso só existiria sem meu pai. Mas claro que tudo tem muitas camadas e também amava meu pai. Então a letra acaba sendo a fantasia de uma morte emocional dessa figura agressora – “Não te quis tirar eu a vida, fui sangrar o meu coração. Foste vivo cá dentro de mim e agora és poça no chão”.

  1. Tábuas, Pregos e Flores (feat. Benke Ferraz, Toca Ogan e Lumanzin)

Hélio Morais (voz e percussão), Benke Ferraz (samples), Toca Ogan (percussão), Lumanzin (coros) e Edgar Valente (coros)

Em adulto, por mais que tenha consciência de que a experiência também me moldou e definiu (nem que seja pelo oposto), a verdade é que me considero feliz. Então esta letra acaba sendo um funeral desse meu passado (“Tenho à vista um caixão espelhado. O meu duplicado vai a enterrar. Deito flores sobre o meu passado. Choro emocionado por poder sonhar”) e é chegado o tempo de cantar e celebrar a vida. É um funeral feliz.

  1. Almoço de Domingo (feat Benke Ferraz, Kastrup e Rita Osório)

Hélio Morais (voz, guitarra clássica, sintetizador e assobio), Benke Ferraz (sintetizadores, samples e guitarra), Guilherme Kastrup (percussão), e Rita Onofre (coros)

A música fala sobre as memórias que um menino português, com pais angolanos, tem dos almoços de domingo na casa de sua bisavó. Almoços onde reinava o convívio durante todo o dia, em volta da mesa e com muita música. Um lugar que fascinava esse menino, ao mesmo tempo que, crescendo já em Portugal, se via colocado num lugar muito diferente de tudo o que o rodeava. Era fascinante e queria fazer parte de tudo aquilo, mas ao mesmo tempo, e porque vivia com seu pai e não com sua mãe (neta dessa bisavó), se sentia tímido e meio deslocado, nesses almoços pontuais.

  1. Deixa o Resto (feat. Benke Ferraz)

Hélio Morais (voz e guitarra clássica), Benke Ferraz (samples, guitarra clássica e percussão), Djalma Rodrigues (guitarra) e Edgar Valente (coros)

Quando estava terminando o disco, não sabia se iria querer fazer outro. Este foi muito pessoal, muito questionamento, muita terapia, muito revisitar de coisas que nem lembrava (ou reprimia). Então, a verdade é que quis terminar esse disco com um ponto de interrogação (“Espero ver-vos a todes de pé, quando sumir na maré”). Gosto dessa ideia de conhecer todo mundo bem, antes de partir, sendo que não se sabe se essa partida é um adeus ou um até já.

Foto em destaque: Ana Viotti / Divulgação

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