BK’ incendeia o Circo Voador com show imperdível
Rapper mostrou músicas de seus dois discos em apresentação marcada por um olhar reverente ao passado e apurado sobre o futuro
Quando as luzes se apagaram na lona do Circo Voador, já na madrugada de sábado, antes do show de BK’, a banda que o acompanha entrou e um telão se acendeu com imagens chuviscadas. Ao fundo, a voz de Mano Brown, líder do Racionais MC’s, cujo grupo influenciou e moldou algumas vezes toda a cena de rap desde sua fundação. “Outra coisa que eu ia falar com você é a musicalidade, gostei bastante da musicalidade. Achei você bem corajoso, saiu da zona de conforto, se expôs e foi versátil “, diz, entre outros elogios. Nenhum deles é exagerado.
É sintomático que o show do rapper comece com um discurso de Brown, porque BK’ mostra logo o que pretende: reverenciar o passado enquanto olha com afinco para o futuro. Essa dinâmica permeia todo show, com mais de 2/3 da apresentação com integrantes da banda e o bis e suas músicas subsequentes apenas na dinâmica clássica do rap: um MC (ou muitos deles) e um DJ. O público, que lotou o Circo, já estava ganho na abertura com ‘Novo Poder‘, que faz parte do excelente ‘Gigantes‘, lançado em 2018.
O álbum foi a base da apresentação, de cerca de 1h30, que também contou com músicas do primeiro disco do rapper, Castelos & Ruínas (2016), igualmente bem recebidas pelo público. A banda, um show à parte, é composta de um tecladista, baixista baterista, DJ e o auxílio luxuoso de Juyé (ótima no dueto em ‘Gigantes‘, a faixa) e JXNV$, nos vocais de apoio.
Entoando sucessos com participações especiais, Baco Exu do Blues e Marcelo D2 eSain fizeram boas participações em ‘Vivos‘ e ‘Falam‘, respectivamente, BK’ versou com a habilidade usual, arriscou passos de dança e pulou junto com a plateia. “Estou olhando no olho de cada um aqui”, exagerou. “Vamos fazer a maior festa”, disse, emendando ‘Jovens‘, que teve a primeira invasão de palco, com ‘Deus do Furdunço‘. Entre os grandes momentos, estão a conexão forte entre artista e plateia em ‘Abebe Bikila‘ (nome de batismo do rapper), ‘Julius‘, em versão pesada e ‘Titãs‘. Outro dos convidados de luxo foi o lendário saxofonista Leo Gandelman, que presenteou o anfitrião com um safoxone e solou nas canções citadas. Galdeman parecia se divertir tanto ou quanto mais que os presentes. “Vim aqui te trazer um presente”, anunciou. Sorte de quem presenciou história.
No bis, o rapper emendou um bloco de canções apenas acompanhado do DJ, de Akira PresidenteeDrik Barbosa, as melhores participações da noite, que incendiaram a casa com ‘Correria‘, talvez o número mais festejado. Logo após, Brill e CHS, do o antigo grupo de BK’, Nectar Gang, terminou com uma sequência matadora, relembrando os tempos de convivência nos eixos dos bairros da Lapa, Catete e Glória — uma bela viagem nostálgica. Recado direto: não perca uma apresentação de BK’. O show é ao mesmo tempo reverente e impactante, uma carta de intenções com endereço ao futuro de alguém bastante atento ao redor, que calcula seus passos, com qualidade muita acima da média. E o futuro é promissor.
Avaliação: ótimo