Terno Rei abraça o pop e alça voos maiores com ‘Violeta’

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Quarteto paulista expande paleta sonora sem medo de soar pop, em disco vibrante e conciso

Quando entrevistamos o Terno Rei após um show em um festival no Rio de Janeiro, no ano passado, o guitarrista Bruno Rodrigues foi taxativo quanto ao terceiro disco, à época pouco mais avançado que a pré-produção: ‘dessa vez, queremos acertar em cheio’. Quase um ano depois, a constatação: eles conseguiram. Com Violeta, o quarteto paulista expandiu sua paleta sonora e não tem medo de soar pop, no sentido amplo que a palavra carrega. O resultado é um álbum vibrante e conciso em 11 faixas, que marca um ponto de virada na carreira do grupo, em evolução desde a estreia com Vigília (2014).

Com o bom EP Trem Leva Minhas Pernas (2015) e o ótimo Essa Noite Bateu Com Um Sonho (2016) é possível notar uma mudança suave — a estética do dreampop e shoegazer aliada à melancolia das letras do baixista e vocalista Ale Sater dominam a estreia, mas a banda faz uso de influências e paisagens sonoras mais diversificadas tanto no EP quanto no disco sucessor, bem como na temática das canções. No entanto, o salto do Terno Rei é muito maior e, portanto, mais arriscado com Violeta. Produzido com esmero e apuro pelos curitibanos Gustavo Schirmer e Amadeus de Marchi, o álbum é extremamente bem-sucedido por conseguir desvincular a banda de uma espécie de nicho indie dentro do indie ao inserir elementos novos e manter uma certa familiaridade atrelada à obra, sem ser deslocado ou abrupto.

A boa dinâmica entre as guitarras de Rodrigues e Gregui Vinha continua, o baixo de Sater está tão rítmico quanto melódico e a bateria de Luis Cardoso é marcante,  diversificada. As novidades ficam por conta dos sintetizadores, que ganharam uma presença maior nas canções e são usados pelos dois guitarristas, e a inserção de violões /percussões/pianos como recursos harmônicos. A primeira faixa, Yoko, se conecta com o trabalho de diversas bandas brasileiras que fazem um pop bem feito atualmente: extremamente radiofônica, com refrão cantarolável e a clássica estrutura versão refrão verso refrão ponte, revelando uma espécie de riff dos synths que, sim, você se verá assobiando. A música resume bem o que é o disco e o que os quatro querem alcançar.

Dia Lindo, a mais curta de Violeta, mostra a melancolia e navega por lembranças de Sater, envolvidas em um quase rap, e explora o falsete e os vocais de apoio de Rodrigues com precisão, rimando ‘triste’ com ‘decidiste’, enquanto o narrador se agarra às boas memórias para seguir em frente. Solidão de Volta, que ganhou clipe, vai por um terreno familiar ao mesmo tempo que acena para influências oitentistas, principalmente nas guitarras, contando a história de superação de um amor. O vídeo, alias, casa com um tema caro ao álbum, o próprio conceito de melancolia atrelada à cidade, que pode ser São Paulo (e muito mais São Paulo, é verdade) mas qualquer lugar em que quem ouça encontre eco na diversificação dos sentimentos e situações explorados nas canções — paisagens reais ou oníricas, dores, superações e pertencimento.

Nesse sentido, 93 e Medo fazem uma senhora dupla. A primeira mostra o eu lírico desalentado por perder alguém, com a tristeza e a segunda é uma carta de intenções do Terno Rei, quase um manifesto sobre superação (inclusive de estar em um nicho) em suas variadas formas. Os sintetizadores fazem as vezes de guitarras e há, literalmente, um interessante duelo de riffs e Sater volta a investir nos falsetes com propriedade. Estava Ali, grata surpresa na voz de Bruno, é mais um exemplo do pop bem acabado que o quarteto quer alcançar. Tal dinâmica, com boas pausas e seu não-refrão, a guitarra que chega pelo canal direito e ‘canta’ a melodia, a tornam uma das melhores faixas do álbum. Outra boa novidade é a quase instrumental Amor Perfeito, que versa rapidamente sobre devaneios e sonhos.

São Paulo retoma a reflexão sobre perdas enquanto a própria cidade se torna personagem e contribui para ampliar a melancolia do seu narrador: “Em São Paulo, onde a chuva cai a tarde e os carros se debatem/Oh São Paulo e a gentil hostilidade/Eu vejo sempre dois lados“, canta Ale. Luzes de Natal é outro bom exemplo de como a sonoridade da banda se expande e se amarra facilmente a coisas novas. À primeira vista, parece uma continuação do hit Litoral mas eis que o violão surge tímido, mas preciso, no refrão, amparado por camadas eletrônicas e uma marcante frase de guitarra. Roda Gigante, a mais ousada do disco, contém uma junção mais profunda das eletronices, com timbres variados de sintetizadores, uma melodia grudenta que cai num inesperado solo de guitarra sujo e põe a atração do parque como fio de boas memórias em exercício de contemplação.

O álbum encerra com Vento na Cara, que soa familiar, mas continua a desbravar o terreno e aposta em uma mistura de timbres, falsetes e vocalizes diversos, com direito a uma subidinha de tom. Toda a construção aponta, possivelmente, um caminho com várias bifucarções para ser explorado pelos integrantes em um futuro próximo. Violeta é um grande disco que cresce a cada nova audição, o melhor do Terno Rei, e os coloca em outro patamar de quem sabe o que alcançou e o que quer alcançar, abraçando uma nova fase sem amarras e restrições.

Avaliação: Excelente

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