Atuações salvam ‘Bird Box’ do desastre completo
Filme baseado em livro falha ao conduzir duas tramas paralelas com roteiro fraco e diálogos vexatórios
Bird Box ser um filme ruim é quase um contrassenso. Dirigido por Susanne Bier (dos ótimos Brothers e Em Um Mundo Melhor), a adaptação do livro de sucesso de Josh Malerman em cartaz na Netflix, só não é um desastre completo por conta da atuação de seus três protagonistas, especialmente Sandra Bullock. Neste thriller pós-apocalíptico, acompanhamos Sandra como Malorie Hayes, uma artista que se descobre grávida antes de um fenômeno que causa a morte de milhões no mundo. Uma aparente entidade causa loucura e induz ao suicídio quem ‘a enxerga’, dizimando a humanidade no processo e forçando os sobreviventes a se locomoverem com vendas nos olhos.
É importante frisar que o filme de Susanne funciona como duas produções separadas, o que não seria um problema se a forma como estas escolhas são colocadas não fosse tão decepcionante. A maior parte se passa logo após a tragédia, com Malorie se abrigando em uma casa com desconhecidos que tentam entender o que está acontecendo. O outro trecho, muito mais interessante, mostra a travessia da mulher e duas crianças, chamados de Garoto e Garota, respectivamente, ao longo de um rio que leva a um ‘abrigo’ que os protegerá da ameaça.
Na casa, há uma sucessão de personagens mal construídos, que abusam do clichê e se veem em situações pouco verossimeis, com diálogos esdrúxulos. Há o dono da residência, que aparece para explicar o caso e sai de cena tão rápido quanto entrou; a tensão sexual forçadíssima entre uma policial e um traficante; o ‘vilão’ feito por umJohn Malkovich esforçado em não deixar a coisa desandar; o que se sacrifica pelo grupo em nome de um pequeno-grande avanço; e a galeria dos que estão ali apenas para compor elenco, como o caso da personagem da grande Jacki Weaver, praticamente desperdiçada em cena.
Na travessia do rio, Sandra e as crianças seguram a barra como podem, com a mão amiga de Susanne na condução entre as situações que envolvem a ausência de sentido dos três. Há bons exemplos de tensão, construídas com rigor narrativo que lembram os outros filmes da diretora (a sequência da ‘outra casa’ é um exemplo), mas algumas, como o destino de Tom (Trevante Rhodes, em bom papel), são um esforço mirrado para tentar dar alguma coesão ou emoção ao roteiro fraco de Eric Heisserer (do ótimo A Chegada).
No clímax do filme, Bird Box finalmente mostra a que veio e entrega sua origem, conectada ao início da história: uma grande reflexão sobre aceitar e entender o que é a maternidade e seus enormes desafios. Neste último ato, o resto parece corrido e apresentado de forma primária — é difícil segurar a sensação de perda de tempo, como se estivéssemos assistindo a uma novela que é retalhada para ficar entre o blockbuster e o cult, falhando totalmente neste aspecto. Mesmo sendo o filme de maior audiência na plataforma de streaming, é melhor ficar com o livro.
Avaliação: Ruim